domingo, 24 de maio de 2015

MARIA MORTE

Por Maria Antônia Teixeira da Costa


Ser chamada de Morte não é para todo mundo, pois a morte no Ocidente sempre foi considerada algo difícil de lidar, triste, e temerosa. Imagine nos dias de hoje alguém ter o apelido de Dona Maria Morte?


No entanto, a morte é encarada pela maioria do povo do Oriente como celebração para uma nova vida.
Foto copiada da internet



 Nós procuramos encarar a morte assim: celebração para a vida. No dia do enterro de papai fizemos uma festa de risos e alegrias, apesar do choro, afinal ele era a alegria em pessoa. A maioria dos amigos que foi visitá-lo lembrava uma piada que algum dia ele contou.  Mas, como era de se esperar, fomos recriminados por muitos por nossas risadas. Não importa, tudo já passou e ele está brilhando junto com as estrelas, acredito nisso.

Cito o exemplo da morte de papai (seu Lucas do Motor), para dizer que a morte já nos visitou de perto. Pois bem, hoje vamos falar da Morte, mas não é qualquer Morte, é de Dona  Maria Morte. Conversei com seu filho Pedro Emídio e ele nos repassou algumas informações e autorizou a publicação desse artigo, desde já obrigada.


Pedro Emídio ao centro da foto, minha prima Antônia, casada com Pedro, Maria (irmã de Antônia), também minha prima, as duas filhas de meu tio-avô, Antônio Francisco da Costa (conhecido por Antônio Conduru, o primeiro artesão que conheci em Touros, fazia fogos de artifícios, balões coloridos que enfeitavam os céus de Touros) e meus dois primos (Foto copiada do Facebook de Pedro Emídio)


Maria Morte, assim ela ficou conhecida na cidade de Touros, por muitos de nós. Maria Isabel dos Santos, o seu verdadeiro nome. Ela nasceu no dia 23 de agosto de 1926. A sua mãe chamava-se Francisca Estanislau de Morais e seu pai Benedito José de Morais. Maria Isabel casou-se com Alfredo Gomes dos Santos aos l6 anos e conviveu com o mesmo um período de 06 anos ( 1942 a 1948) e teve 05 filhos desse casamento: Sebastião dos Santos;  Mª Emília dos Santos; Mª Inês dos Santos; Pedro Emídio dos Santos (casado com minha prima Antônia) Mª Venus dos Santos.

Depois da separação de Dona Maria Isabel ela, segundo Pedro Emídio,   teve outros relacionamentos dos quais nasceram mais quatro filhos, destes,  três foram adotados e registrados pela mãe dela: José de Arimatéia de Morais; Francisco de Assis Morais; Paulo Eduardo de Morais;  Maria Auxiliadora dos Santos

A história dos nomes, dos apelidos das pessoas é bem interessante. Sempre fiquei curiosa em saber por que chamavam Dona Maria Isabel dos Santos de Maria Morte. Pensava que era porque ela sempre estaria presente nos velórios das pessoas, mas descobri que não era isso não.
 Foi numa noite de 25 de março de 2013, na casa de Dona Terezinha Teixeira que descobri o porquê do apelido que deram a ela.

Dona Terezinha contou-me que no início dos anos de 1940, Maria Isabel era aluna do Grupo Escolar General Florêncio do Lago e toda quinta-feira tinha a recitação de poesias e a professora dela deu uma poesia para Maria Isabel  recitar intitulada “A Morte”. Todas as vezes que a chamavam para recitar uma poesia ela dizia: A morte... e assim começava. A partir dai Maria Isabel ficou conhecida pelo apelido de Dona Maria Morte.

Quem matou a minha curiosidade foi Dona Terezinha Teixeira, a qual com muita lucidez,  recitou para mim e eu gravei em fita K7 a referida poesia que diz assim:


“A Morte”

“A  morte é preta,
Dela ninguém escapa
Nem o Rei, nem o bispo, nem o papa.
Escapo eu,
Tenho uma panelinha, vou para dentro,
Fecho bem fechadinha,
A morte passa e diz:
Aqui não tem ninguém.
E assim como a morte passa,
Passem os senhores muito bem.”

Dona Maria Morte faleceu no dia 12 de junho de 1993 e foi uma mãe exemplar, foi uma mulher feliz. Conviveu com esse apelido durante toda a sua vida até a hora da morte.

Eu Tenho aprendido que a morte não é preta, não é feia, mas sim ela é jovem e bonita e também traz esperança, é um recomeço para uma nova vida. Em minhas reuniões com meus filhos sempre falamos sobre a morte e sempre procuro deixar tudo preparado como se fosse morrer amanhã. 













segunda-feira, 4 de maio de 2015

SEU LUCAS DO MOTOR E A LUZ DA CIDADE - Parte I


Linda fotografia do luar de Touros por  Dione Nascimento

Seu Lucas do motor, assim ele é conhecido na cidade de Touros RN, pois foi durante quase vinte anos o responsável pela manutenção dos motores que forneciam a iluminação pública da cidade. Seu verdadeiro nome é Luiz Emídio da Costa. Nasceu em 15 de outubro de 1924 e faleceu em 27 de janeiro de 2007. É filho de Antônia Pereira da Costa e Emídio Francisco da Costa (Emídio Condurú) Ele morava à Rua Cel Antônio Antunes, 23. Casou-se em 1959, com Maria do Céu Teixeira da Costa com a qual teve dez filhos, entre eles, eu que escrevo esta história a partir de seus relatos orais e nossas lembranças.

 
Luiz Emídio da Costa na Avenida Prefeito José Américo-Touros-RN em 1987, ao fundo da fotografia a casa onde viveu Vitalina
Nascido e criado em Touros viu o tempo passar e ficar em seus oitenta e dois anos (82) anos de idade vividos. Perdeu seu pai quando tinha aproximadamente 30 anos e passou a cuidar da sua mãe e suas irmãs enquanto seus outros irmãos foram para o Rio de Janeiro. Assumiu então a profissão de seu pai e passou a fabricar anzóis de diversos tipos, vendidos aos pescadores do local, bem como na capital do Estado. Além disso, cuidava da luz da cidade e com a chegada dos filhos tornou-se pai aos 35 anos de idade.
Pai no sentido completo que podemos afirmar do que é ser um pai. Ele nos gerou e nos amou de uma maneira maravilhosa. A sua racionalidade e sensibilidade se aliavam de tal forma que diria, se meu pai tivesse tido oportunidade, seria conhecido hoje como um doutor, um grande cientista, um grande artista. Eu e meus irmãos aprendemos com ele muitas lições de vida, aprendemos valores inestimáveis: a simplicidade, a honestidade, o respeito, o amor.

Ainda criança, em Touros não havia cinema. Lembro-me como se fosse hoje, ele levou-nos para assistir vários filmes, entre eles, “Os brutos também amam”, “A lenda de Tarzan”. Esses dois são os que mais marcaram minha infância. Isso aconteceu no início da década de 1970. Os filmes aconteciam no salão da antiga casa paroquial que ficava na rua da antiga prefeitura, a qual foi demolida.

Fomos muitas vezes, também, assistir ao show de João Redondo, hoje conhecido por Mamulengo. Era uma espécie de divertimento popular onde através de um palco ligeiramente levantado, bonecos dramatizam histórias. Semanalmente, nos finais de semana eram apresentados no antigo Centro Operário Tourense, se não me engano, hoje lá funciona o Fórum de Touros.
    Centro Operário Tourense em 1975- Foto do Livro Touros à Meia-tinta do autor: Geraldo Gonzaga da Costa

Quantos pais não têm tempo para seus filhos? Muitos. A maioria não participa da infância de seus filhos e quando se dão conta, o tempo passou, os filhos tornaram-se homens e mulheres, casaram, foram embora de casa. Com nosso pai não foi assim.

Todos os dias à tardinha ele pegava sua bicicleta e colocava minhas irmãs, Maria Auxiliadora e Maria Alécia no bagageiro e eu ficava dentro de uma cesta que ele colocou na frente da bicicleta e ia passear conosco até à praia. De manhã cedo, nos finais de semana, nos levava para tomarmos banho de mar e dizia para tomarmos três goles de água salgada, que conforme ele dizia era bom para muitas coisas, como para abrir o apetite, para gripe entre outros males.

Eu ainda pequena e ele me ensinava pequenas poesias as quais eu memorizava e recitava-as para os seus conhecidos quando íamos passear. Nessa época eu tinha cinco anos de idade. Durante toda a minha existência ouvi papai contar muitas histórias sobre a cidade de Touros.

Na nossa infância ele nos levava para ouvirmos histórias das pessoas mais velhas. Minha irmã Maria Alécia, está com um projeto de escrever um livro com essas histórias.
Ele era um homem brincalhão, todos conhecem essa sua característica. Além de histórias verídicas, contava-nos piadas bem engraçadas, tinha um humor fantástico. Fazia todos rirem com suas palhaçadas.

Atualmente todos falam em economizar energia, economizar água, pois creiam, em minha infância o nosso pai sempre falava sobre isso, ensinávamos a economizar. Ele dizia que um dia a água e a energia podiam acabar.

Hoje se fala em direitos iguais para homens e mulheres, em nosso cotidiano vivenciamos isso em vários pontos do relacionamento de papai e mamãe. Por exemplo: mamãe trabalhava à tarde, quando ela chegava em casa a janta já estava quase toda pronta; ele lavou muitas fraudas nossas, nos deu mamadeiras, conforme mamãe nos relata. Em nossa adolescência, pudemos observar que ele realizava muitas atividades para ajudar mamãe. Até mesmo quando mamãe ia dar à luz ele ajudava às parteiras, pois muitos dos seus filhos nasceram em casa. Mesmo com uma pessoa que nos ajudava nas tarefas, nosso pai sempre foi aquele homem cuidadoso, amoroso, carinhoso. Às vezes ele era muito duro conosco, mas jamais perdeu a ternura.

Além de tudo isso, ele trabalhava e muito, ele cuidava da luz da cidade, através da manutenção dos motores geradores da energia. Papai era um homem muito inteligente, era ele quem fazia as instalações elétricas das casas, consertava vários tipos de eletrodomésticos da época, e também, motores de carro. Depois de meados dos anos de 1980, outras pessoas foram aprendendo o ofício

Perguntamos a papai (Seu Lucas do Motor)  em 1987 como era a iluminação pública na cidade de Touros e nos respondeu baseado em suas lembranças e em suas experiências. Papai tinha uma memória extraordinária. 

Antes dos anos de 1920 a lua  iluminava a cidade de Touros-RN, como canta o poeta, José Porto Filho na canção Luar de Touros.


“Quando em noites de luar, em minha vila.
 Até a própria natureza se retrata.
E o clarão do luar que então cintila.
Vem convidando o meu amor à serenata.

Não pode haver luar, assim, tão belo.
Como o luar da minha terra amiga...
Cada coqueiro a ensaiar uma cantiga
No farfalhar do seu leque bem singelo

O céu se torna marulhado em prata
E a terra cheia de ofuscante luz.
Quando o clarão da lua se desata
Em jorros, na Matriz do Bom Jesus!

[...]
  

Touros foi também iluminada por lampiões que eram abastecidos com querosene, contou papai, dos anos de 1920 até 1948. Havia um lampião a querosene no Centro Operário Tourense, onde hoje funciona o Fórum; outro na frente da casa de Izaque, onde é hoje a casa de Dona Salete (situados na rua Cel Antônio Antunes) outro na casa de José Porto, ex-prefeito de Touros nos anos de 1934, na antiga rua do Capim; um na antiga Prefeitura da cidade, denominada de Palácio Porto Filho, a qual foi demolida; havia ainda um lampião em frente a casa de Joça da Mata, situada hoje na rua Pedro II, aonde morou seu Manoel Cândido e sua família.

Em 1948, assume a Prefeitura da cidade de Touros, o vice-prefeito, Severino Rodrigues Santiago, conhecido como Severino Grilo, em virtude do falecimento do então prefeito Arthur Costa e Silva.