domingo, 13 de abril de 2014

PARTE II - PROFESSORA NEUZA DE AGUIAR E SEU LEGADO EDUCACIONAL


As professoras Neuza de Aguiar (92 anos) e Maria Antônia Teixeira da Costa (40 anos) em 2001 ( Foto do arquivo da professora Maria Antônia)


Em 28 de novembro de 1929, o diretor da Escola Normal de Natal, Theodoro Câmara, conferiu a Neuza de Aguiar o diploma de professora primária com todos os direitos e prerrogativas que lhe eram inerentes.

Neste período receber um diploma da Escola Normal de Natal era sinônimo de participar de um grupo privilegiado, pois a seletividade do ensino era grande e poucos tinham acesso sequer ao primário no Rio Grande do Norte. As exigências formativas eram rigorosas, os professores da Escola intelectuais, a Escola Normal era um centro de excelência de formação de professores.

A professora Neuza de Aguiar lembrou de seus professores, entre eles: Dona Júlia, professora de Matemática, o professor Francisco Ivo, Alfredo, Dr Severino Bezerra, também era professor. 

Citou também o nome de suas colegas de curso, realizado na Escola Normal em Natal: Inaldir Monteiro, Margarida Melo, Nazaré Madruga, Judite, irmã de Dom Nivaldo Monte. Concluíram nessa turma 13 mulheres e 1 homem.  Para ela e a maioria das moças, os divertimentos dos anos em que cursou a Escola Normal (1926-1929), eram os passeios nas praças e nas ruas do centro da cidade e as idas aos cinemas. Ela e suas amigas mais próximas iam ao cinema Royal e o Politeon. Quem tinha namorado combinava e os levava. Tinha o fadango na esquina da Rio Branco e também o pastoril. Diz ela que “outras vezes a gente dançava. O divertimento era esse. Não se falava em droga. Os jovens não bebiam. A gente convidava o namorado para ir ao cinema, mas não pegava nem na mão, nem se beijava. Eu namorei com um que nunca me beijou”.

A professora Neuza de Aguiar inicia sua carreira como professora em 16 de julho de 1930 ao ser nomeada pelo então Presidente do Estado do Rio Grande do Norte, Juvenal Lamartine Faria para reger, interinamente, o Curso Infantil Mixto do Grupo Escolar “Capitão José da Penha”, de Baixa Verde, aonde permaneceu até 1933 quando foi nomeada pelo Diretor Geral do Departamento de Educação, Jerônimo Bezerra, de acordo com o livro 2, 177, para reger, efetivamente, a Escola Rudimentar Masculina “João Tibúrcio, de Espírito Santo, no município de Goianinha/RN.

Em Goianinha as dificuldades foram muitas. Ela nos conta um pouco de sua história: “De Espírito Santo para eu ir ensinar eram três léguas. Eram três léguas de Espírito Santo para Goianinha. Eu ensinava numa casa alugada.Tudo era diferente. Até para Goianinha a gente ia pé, ou a cavalo. A gente adoecia logo. Quando chegava em Goianinha dormia na casa de pessoa amiga. Tinha tanta cobra e sapo cururu. As cobras entravam na escola. A cidade era toda de areia. Não tinha televisão, nem rádio. Não tinha nem luz elétrica, a gente colocava um candeeiro para poder estudar. Eu ficava lendo. Ensinei 4 anos em Goianinha” .

A professora Neuza de Aguiar permaneceu quatro anos em Goianinha, quando por Acto nº 1.055, de 25 do corrente, do Sr Governador do Estado, foi mandada servir, interinamente, no Grupo Escolar “Cel Antônio Lago”, da Villa de Touros em 27 de janeiro de 1937. Passou nove anos como professora, após algumas promoções e mudanças de níveis, assume a direção do Grupo. de 1946 ao ano de 1967. O Grupo funcionava em 1946 com apenas o turno matutino e havia três professoras: Maria Tavares de Melo, Maria Tereza de A. Teixeira e a própria diretora, Neuza de Aguiar.
  A professora Neuza de Aguiar(93 anos) e a sua ex-aluna e professora  Paula Frassinete em Natal na residência da professora Neuza em 2002 




A professora Neuza de Aguiar narrou que durante os anos em que exerceu a direção do Grupo Escolar Cel Antônio do Lago., realizou tanto atividades relativas à direção escolar, aos serviços de secretaria e outras atividades, o que Paro (2002) denomina de atividades-meio, quanto atividades de ensino-aprendizagem, ou seja, atividades-fim, pois a mesma além de diretora é professora.
 
Quanto às atividades-fim, ela, junto às demais professoras, organizava dramas, bailes, quadrilhas, passeios para os municípios vizinhos. Essas atividades eram ensaiadas meses afinco e quando os alunos estavam preparados apresentavam os dramas para a comunidade no Centro Artístico e Operário Tourense, fundado em 1921 (demolido nos anos de 1970). As quadrilhas eram apresentadas na Quadra do Grupo Escolar e envolvia toda a comunidade, além dos bailes e passeios para os municípios vizinhos que a turma adorava.
O Grupo Escolar era um palco cultural e todos o valorizavam. “O folclore tourense manifestou-se com intensidade e alegria nas representações teatrais levadas a efeito no palco do Centro Operário Tourense e no Grupo Escolar Cel Antônio do Lago [...] (PATRIOTA, 2000, p.109).

Algumas das festas citadas, como a páscoa, o dia das mães, o dia sete de setembro, o dia do professor, envolvia toda a comunidade. No caso do Grupo Escolar Cel Antônio do Lago, o envolvimento da comunidade era enorme, inclusive as professoras colaboravam com o Centro Artístico Operário Tourense. 

Quanto ao material didático a professora Neuza de Aguiar revelou que usava em sua aula os livros, entre eles o de Admissão ao Ginásio, utilizava mapas e o globo. Paula Frassinetti, sua aluna, nos relata que esse material didático foi sendo ampliado à medida que as professoras se especializavam, o que foi acontecendo, no seu caso, a partir de 1962, ano em que ela começou a ensinar no Grupo Escolar Cel Antônio do Lago, quando a professora Neuza de Aguiar era diretora.
Os livros didáticos, conforme a nossa pesquisa no Jornal “A República”, eram adotados pelo Departamento de Educação, o qual publicava através de portarias, as relações dos livros a serem trabalhos nas escolas primárias. As relações eram diferenciadas para os Grupos Escolares, as Escolas Reunidas e as Escolas Isoladas. (A REPÚBLICA, jul.1946). Conforme a professora Neuza de Aguiar, a leitura era realizada todos os dias em sua sala de aula e isso mesmo ela cobrava de suas colegas professoras, havendo um respeito entre todas.
De acordo com os depoimentos de Paula Frassinetti, sua ex-aluna de 1956 a 1960 e a partir de 1962, professora do Grupo Escolar Antônio do Lago, a professora Neuza de Aguiar era competente, correta, dava aula com domínio de conteúdo, parece que tudo estava em sua cabeça, pois não precisava olhar para nenhum papel. Como aluna da referida professora, ela relembra quando estudou a 5ª série, o livro indicado era o Programa de Admissão ao Ginásio. As provas eram chamadas sabatinas. A professora Neuza de Aguiar chamava o aluno pela caderneta o qual retirava o bilhete de dentro de uma caixa e explanava o assunto. Após a explanação vinham as perguntas. Na leitura era assim: ela indicava o aluno para iniciar a leitura, batia palma e o aluno seguinte continuava.
Com a publicação de sua aposentadoria em 19 de julho de 1969, no Diário Oficial do Estado do Rio Grande do Norte, aposentou-se a professora Neuza de Aguiar, no cargo de professor do Ensino Primário, do Quadro do Magistério Público do Estado, lotada no Grupo Escolar Antônio do Lago. Relatos nos permitem afirmar que ao adentrarmos o velho e abandonado Grupo Escolar Cel Antônio do Lago, parece que ouvimos o ressoar do sapato da professora Neuza de Aguiar, batendo forte no assoalho do grupo: toc, toc, toc, e todos vão se organizando e se recolhendo em suas travessuras.

A professora Neuza de Aguiar partiu (morreu) em 2003 e deixou para a história do povo de Touros um grande legado educacional.